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Fake News e suas consequências

Fake News e suas consequências

Esta matéria, publicada na íntegra, de inteira responsabilidade do autor, é uma contribuição recebida por e-mail e não representa, necessariamente, o espírito da campanha.

Por Carlos Eduardo Rios do Amaral

O Dicionário Online de Português assim define o estrangeirismo “fake news”: “notícias falsas; quaisquer notícias e informações falsas ou mentirosas que são compartilhadas como se fossem reais e verdadeiras, divulgadas em contextos virtuais, especialmente em redes sociais ou em aplicativos para compartilhamento de mensagens”. O Wikipédia diz que “fake news” são “uma forma de imprensa marrom que consiste na distribuição deliberada de desinformação ou boatos via jornal impresso, televisão, rádio, ou ainda online, como nas mídias sociais”. Em suma, na sua tradução livre, “fake news” significa “notícia falsa”, uma “mentira”.

Daí vem a indagação, “fake news” é crime no Brasil?

O Art. 5º, Inciso XXXIX, da Constituição Federal de 1988 proclama: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. É o chamado Princípio da Legalidade em Matéria Penal (Nullo crimen, nullo poena sine lege praevia). Sem lei penal, sem fato anterior à edição da norma incriminadora, não temos crime. Poderemos estar diante de uma imoralidade, de um ilícito civil ou de um pecado grave, mas sem lei anterior que o defina e comine pena não temos crime.

Observando nossa legislação penal doméstica – o Código Penal e sua legislação extravagante – , verificamos que, definitivamente, “fake news” não se constitui em crime no Brasil. Tanto pela ausência de previsão de seu tipo normativo, assim como pela ausência de qualquer cominação de pena.

Alguns projetos tramitam no Congresso Nacional a respeito do tema, visando a criminalização das “fake news”. Vejamos:

“Divulgação de notícia falsa
Art. 287-A – Divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar ou corromper a verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segurança pública, à economia nacional, ao processo eleitoral ou que afetem interesse público relevante.
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 1º Se o agente pratica a conduta prevista no caput valendo-se da internet ou de outro meio que facilite a divulgação da notícia
falsa:
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 2º A pena aumenta-se de um a dois terços, se o agente divulga a notícia falsa visando a obtenção de vantagem para si ou para outrem”.

Como se vê, trata-se apenas de projeto de lei, ainda sem qualquer repercussão no Direito Penal, que inclusive poderá vir a ser rejeitado ou arquivado.

O fato das “fake news” não se constituir, por si só, em crime no País não significa que não possa servir como um dos vários atos ou meio para a prática de determinado crime (crime plurissubsistente: crime praticado por mais de um ato).

Se espalho nas redes sociais que Cristóvão Colombo pisou na Lua com a Apolo 11 em 1969, estou claramente divulgando uma “fake news”. Sem, evidentemente, nenhuma repercussão na esfera penal.

Agora, se digo aos meus seguidores nas redes sociais que meu vizinho Fulano de Tal planeja matar ou causar qualquer tipo de sofrimento ao meu cachorro, ou que o mesmo teria emitido conscientemente cheque sem suficiente provisão de fundos na praça, estou sem qualquer sombra de dúvidas cometendo o crime de Difamação previsto no Art. 139 do Código Penal.

A “fake news”, no exemplo acima, me serviu de meio para difamar meu vizinho, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação. Se a “fake news” não fosse ofensiva à reputação de meu vizinho, como, por exemplo, se publicasse nas redes sociais que meu vizinho esteve no planeta Marte no último verão, estaríamos diante de uma “fake news” que não constitui crime. Igualmente, se digo nas redes sociais que meu vizinho Fulano de Tal planeja matar ou causar qualquer tipo de sofrimento ao meu cachorro, ou que o mesmo teria emitido conscientemente cheque sem suficiente provisão de fundos na praça, mas não possuo nenhum “amigo” ou seguidor em minha conta de rede social para que terceiros tome conhecimento da publicação, também não estaremos diante de crime, em razão da ineficácia absoluta do meio (crime impossível – Art. 17 do Código Penal).

Destarte, podendo a “fake news”, conforme o caso, vir a se constituir em um dos vários atos ou meio para a prática de determinado crime, nada impedirá sua investigação como elemento de informação no Inquérito Policial e no processo penal.

Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a Autoridade Policial deverá apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais. E, ainda, colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias (Art. 6º, do Código de Processo Penal).

O Juiz expedirá mandado de busca e apreensão, quando fundadas razões a autorizarem para apreender instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso, para descobrir objetos necessários à prova de infração e, ainda, para colher qualquer elemento de convicção para a descoberta da verdade (Art. 240, do Código de Processo Penal).

Nesse toar, a prática de “fake news” quando serviente ao cometimento de infração penal (modus operandi), utilizada como meio de agir, operar ou executar a atividade criminosa do agente, resultará na busca e apreensão de todo o equipamento utilizado para a prática do crime, como, por exemplo, computadores, notebooks, celulares e outros aparelhos afins utilizados. Somente aqueles objetos desnecessários à prova de infração, apartados da apuração oficial do Estado, permanecerão com o acusado.

Em tempo. Quando se fala de “fake news” – e de qualquer coisa! – é importante ter em mente que o exercício de nenhum direito fundamental é absoluto, nem a liberdade de pensamento, nem a liberdade de informar. Nenhum direito pode ser usado para a prática de ilícito ou de ato nocivo que prejudique o próximo e a sociedade. Sempre haverá a relativização e ponderação de valores diante da colisão de direitos fundamentais, com a primazia do bem comum e da ordem democrática.

Essa é a legislação em vigor até o presente.

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Carlos Eduardo Rios do Amaral é Defensor Público do Estado do Espírito Santo

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