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Nota sobre proibição de crianças em contrato de locação residencial

Esta matéria, publicada na íntegra, de inteira responsabilidade do autor, é uma contribuição recebida por e-mail e não representa, necessariamente, o espírito da campanha. Por considerá-la importante e esclarecedora, foi publicada.

Por Carlos Eduardo Rios do Amaral

Como todo negócio jurídico o contrato de locação residencial se submete às disposições do Art. 104, Inciso III, do Código Civil brasileiro em vigor, que dispõe que sua validade requer forma não proibida em lei.

Com bom senso e técnica jurídica optou nosso Código Civil por não arrolar expressamente, uma a uma, as intermináveis hipóteses de invalidade do contrato ou de cláusula contratual por violação da lei.

O Código Civil, assim, prestigia a liberdade e a criatividade contratual entre as partes, desde que preservada as disposições legais que fundamentam e dão sustentação ao nosso Estado Democrático de Direito, notadamente aquelas que consubstanciam a dignidade da pessoa humana.

Nossa Constituição de 1988, em seu Art. 3º, Inciso IV, proclama que constitui objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Um pouco mais adiante, em seu Art. 227, nossa Lei Fundamental assegura que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, nos seus Arts. 3º e 5º preconizam que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana e, ainda, que estes não serão objeto de qualquer forma de
discriminação, punindo-se na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Como se vê, não somente cláusula contratual de determinado contrato de locação residencial, mas de todo e qualquer negócio jurídico que ouse a desafiar o direito à igualdade e não-discriminação é disposição inválida em nosso País, podendo sujeitar o agente discriminador à sua responsabilização civil e à abstenção da oferta em condições contrárias a texto expresso de lei.

Suponhamos um contrato de locação residencial em curso, onde prevista ignóbil cláusula de proibição de criança no imóvel locado. A mulher locatária deverá jurar expressa ou tacitamente cláusula de não concepção, adoção ou guarda de um ser vivo? A concepção, adoção ou guarda de criança constituiriam causa de despejo motivado nesses pactos? A aceitação ou manutenção do pacto locatício dar-se-ia tão somente nos casos da prática de aborto, da retirada involuntária da fila de adoção de pessoa habilitada ou do abandono do órfão pelo seu parente identificado?

Naturalmente, nossa Constituição e as leis da República não toleram a absurda e a inaceitável ruptura da dignidade da pessoa humana em fase de desenvolvimento em qualquer espectro de sua composição social, moral ou biológica.

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Carlos Eduardo Rios do Amaral é Defensor Público do Estado do Espírito Santo

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